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segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Bom para lembrar !!



Missão na África transforma
empresários brasileiros
em embaixadores do País


Evento de negócios que aconteceu
em paralelo à visita oficial do presidente Lula e seus ministros  mostra como o País está despertando interesse nos homens de negócio do exterior
 

Foto Agência Brasil
"Estamos dispostos a identificar formas para evitar que as diferenças de tamanho das duas economias criem desquilíbrios negativos", diz Lula

 
Por Spensy Pimentel, enviado especial a Luanda, Maputo, Windhoek e Pretória
Especial - Agência         -          Brasil Fotos: Marcello Casal
 Uma pausa para o café é suficiente para receber ofertas de negócios tão diversas como a importação de açúcar empacotado, uma joint-venture para a exportação de veículos off-road e um convite para parceria na implantação de uma refinaria de petróleo. O cenário não é uma bolsa de valores, ou o escritório de uma multinacional. O destinatário das propostas não passa deste repórter assalariado. E toda essa curiosidade teve como palco os trabalhos da Missão Empresarial à África, no Country Club de Windhoek, capital da Namíbia, na última sexta-feira.
Foto de divulgação. Não disponível.Foto de divulgação. Não disponível.
Paisagens de Windhoek, capital da Namíbia, uma cidade moderna

Segundo o Itamaraty, 128 empresários brasileiros estiveram envolvidos, na semana passada, nos trabalhos desse evento paralelo à visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a cinco nações do continente. Havia quase 30 anos que o País não organizava evento semelhante na região. Por o que se viu em Windhoek e pelos relatos de empresários que participaram da empreitada, o número poderá ser bem maior nas próximas iniciativas. Para o Oriente Médio, onde Lula estará em dezembro, já há 150 inscrições.
A Bauducco, indústria brasileira do setor de alimentação, já exporta para 56 países, incluindo Angola e Moçambique. Mas, a direção da empresa não conhecera ainda in loco o mercado consumidor, nem os detalhes da operação dos distribuidores de seus produtos em solo africano. A impressão, segundo seu representante na missão, Célio Conrado Rodrigues, foi a melhor possível. “O mercado é muito bom, e a expectativa é de crescimento nos setores de waffers, biscoitos e bolos. As empresas brasileiras precisam desse tipo de iniciativa. Só assim elas vão adquirir cultura de mercado internacional”, diz Rodrigues. Ele afirma que a empresa ainda não participara de missão semelhante: “Sempre fizemos trabalho solo”. O executivo estima que a Bauducco deve chegar em breve a um faturamento de US$ 1 milhão em Angola e Moçambique.
As dúvidas dos potenciais parceiros são as mais diversas. Quando o evento na Namíbia se abre para o debate, as perguntas vêm de todos os lados. O pequeno empresário Joachim Cranz, que monta veículos off-road para turismo em safáris, aponta, em tom inquiridor, que ouviu muito sobre a exportação de produtos para seu país, mas muito pouco sobre a abertura do mercado brasileiro para os “made in Namíbia”. O ministro Luiz Fernando Furlan, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, responde, de imediato, que o Mercosul negocia atualmente um acordo de livre comércio com a União Aduaneira da África Austral, a Sacu. Ele responde ainda a questões sobre a cooperação brasileira na implementação de uma reforma agrária no país e dá uma aula sobre o mercado de capitais no Brasil.
O empresário de ascendência etíope Belete Worku quer esclarecimentos sobre o financiamento e o leasing de aviões da Embraer. Sérgio Aita, representante do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, BNDES, na missão, esclarece que a instituição está à disposição para as propostas de negócios que forem encaminhadas à empresa.
Foto de divulgação Embraer. Não disponível.Foto de divulgação Embraer. Não disponível.
Empresários africanos revelaram interesse em financiamento e leasing de aviões da Embraer

 
Uma senhora lá no fundo da platéia pergunta sobre como pode ter informações sobre a franquia de empresas brasileiras. O diretor de Promoção Comercial do Itamaraty, Mario Vilalva, fala da perfumaria O Boticário, como exemplo do que ela está procurando, e indica-lhe um representante da embaixada local para uma lista completa das oportunidades.
“O verdadeiro mascate é de todos os negócios. E só aparecer a oportunidade”, ensina o paulista Marcos Augusto Guerra, do grupo Agecom, da área de petroquímica. Ele põe em prática o que prega. No intervalo dos trabalhos, conversa com gente interessada em negócios tão diversos como a importação de cosméticos, óleo enlatado e açúcar empacotado. Anota os contatos e diz que, no Brasil, vai encaminhar para os conhecidos. Guerra dá mais dicas: “Todo bom trader, quando chega a um país, o primeiro lugar a que ele tem de ir é o supermercado, para ver se há algum produto de seu país”. O empresário explica que esse é o sinal da boa exportação, a que tem valor agregado. Na Namíbia, anotou, não havia nada de brasileiro nas prateleiras.
“Os empresários brasileiros precisam começar a adquirir a vocação de acreditar no futuro. Não queiram ser pequenos a vida inteira. É a quarta vez que eu vou dizer para vocês. Não tenham medo de virar empresas multinacionais”, disse Lula, em palestra que encerrou as atividades da missão em sua passagem por Maputo, capital de Moçambique, na última quarta-feira (5).
 
Medo de crescer
 
Foto de divulgação. Não disponível.
Hidrelétrica de Capanda construída pela Odebrecht
Entre os quatro eventos organizados pela missão, o mais concorrido aconteceu em Angola. Mais de 100 brasileiros estiveram na reunião em Luanda, na segunda, 3. O país já registra a presença de empresas “brazucas”, como chamam por lá, há mais de duas décadas. A construtora Norberto Odebrecht é responsável pela execução de algumas das maiores obras de infra-estrutura do país, como a hidrelétrica de Capanda, de mais de US$ 1 bilhão. Recentemente saído da guerra - o que traz a demanda por grandes obras de infra-estrutura - e com grandes reservas de petróleo - que lhe dá as condições para o pagamento -, Angola é a menina dos olhos dos empresários brasileiros na África.
Foto Agência Brasil
“Da minha vontade pessoal, as empresas brasileiras fariam sozinhas o serviço aqui”, brincou Lula
Em Moçambique, mais de 60 brasileiros estavam presentes ao evento. O governo do país prepara uma série de concorrências para o desenvolvimento de regiões ricas em recursos naturais no interior, como o vale do Zambeze. Questionado sobre a disposição de as empresas brasileiras participarem da empreitada, o presidente Lula fez graça, na coletiva que concedeu em conjunto com o presidente moçambicano, Joaquim Chissano. “Da minha vontade pessoal, as empresas brasileiras fariam sozinhas o serviço aqui”, disse ele, com a ressalva de que, como a região é “muito rica” em minérios, “muita gente está querendo participar” e, portanto, as empresas brasileiras “terão que fazer alianças, participar das concorrências”.
Ali, a exploração do carvão de Moatize pela Companhia Vale do Rio Doce pode se transformar em um dos maiores empreendimentos de toda a África Austral, segundo o Itamaraty - associado à extração do carvão siderúrgico que interessa aos brasileiros, há a perspectiva do uso de carvão térmico para a geração de energia em termelétricas construídas pelos sul-africanos, além da constituição de um pólo de agribusiness com capital chinês.
A Namíbia teve o menor dos quatro eventos organizados pelo Brasil. Menos de vinte empresários brasileiros se interessaram em participar. Além da barreira da língua, explicam o baixo quórum o pequeno mercado consumidor namibiano (menos de 2 milhões de habitantes) e as dificuldades de conseguir vôos comerciais em tempo de sair de Maputo em direção a Windhoek para o encontro. Na avaliação de um expert em comércio internacional, o empresário da área de satélites João Gilberto Vaz, um erro. Para ele, o país pode se transformar em um portão de entrada para os produtos brasileiros nas áreas de língua inglesa da região. O comércio entre Brasil e Namíbia resume-se atualmente a US$ 7 milhões, 62% dos quais relativos à exportação de mobiliário brasileiro. Mas, a boa infra-estrutura portuária pode mudar esse quadro.
Na África do Sul, o evento foi simultâneo ao da Namíbia, na sexta, 7. A pauta do comércio entre brasileiros e sul-africanos é variada. Num total de US$ 700 milhões anuais, inclui itens de alto valor agregado, como aviões e ônibus. O Brasil tem a intenção de dobrar esse valor em curto prazo, e os automóveis, que já respondem por parte expressiva nessa conta (28,5%), podem ser os principais motores do incremento. Os dois países negociam atualmente um acordo de livre comercio exclusivo para o setor, o que deve favorecer os segmentos de carros populares e picapes.
 
Sem tempo a perder
Foto Agência Brasil
“We don’t have time to lose”, diz Furlan em sua exposição em Windhoek, em referência à integração Sacu-Mercosul
“We don’t have time to lose”, diz o ministro Furlan em sua exposição em Windhoek, abertura dos trabalhos da missão, em referência à integração Sacu-Mercosul. Furlan lembra que o fluxo comercial com a Namíbia ainda é “very very small”e enumera oportunidades de cooperação econômica. O Brasil, conta ele, pode ajudar o país a adquirir tecnologia para processar as cerca de 6 milhões de peles hoje exportadas in natura para a Europa. Ele ainda exalta as virtudes da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e fala sobre os potenciais da indústria brasileira de medicamentos genéricos.
À fala mansa de vendedor de Furlan segue a prosódia veloz do inglês de Vilalva. Sua exposição, a partir de um projetor de imagens geradas pelo computador, começa com uma montagem de fotos da seleção brasileira de futebol, uma paisagem do Rio, Ayrton Senna, Gisele Bündchen, uma passista de escola de samba e uma bela moça de biquíni na praia. “O Brasil não se resume a isso”, alerta o diplomata, para então desfiar um rosário de fatos econômicos, políticos e sociais sobre o ainda desconhecido país, do Fome Zero e o superávit primário recorde ao fato de que o País é uma “nação multirracial pacífica”, que “respeita os credos dos imigrantes”.
Foto Agência Brasil
“Temos de encontrar meios de alavancar as trocas comerciais de modo mutuamente vantajoso", declara o presidente
Depois da abertura para as perguntas, segue-se o café e, finalmente, a palestra do presidente Lula. “Temos de encontrar meios de alavancar as trocas comerciais de modo mutuamente vantajoso. Estamos dispostos a identificar formas para evitar que as diferenças de tamanho das duas economias criem desquilíbrios negativos para a Namíbia”, discursa o brasileiro, como que a dar resposta a perguntas formuladas pela platéia poucos minutos antes de sua chegada.
Dali, o grupo, de quase cem pessoas, segue para um churrasco, no amplo e arejado restaurante do clube. As mesas circulares, de cerca de quinze lugares, estão dispostas segundo as áreas de interesses dos empresários. Em meio a carnes exóticas como a do ôrix, um herbívoro das savanas africanas, ou a do calamar, uma espécie de lula gigante, a aproximação não se interrompe. Um empresário local sai encantado da mesa em que estava com o ministro da Saúde, Humberto Costa. “Vocês têm seres humanos como ministros, não deuses poderosos. É fantástico!”, exclama. Outro exalta a tolerância religiosa como virtude brasileira. “Sou da fé Bahai, que vocês reconhecem, respeitam. Em 1992, uma data importante para nós, foi aprovado no Brasil um ato legislativo que nos cumprimentava por nossa comemoração. Isso foi um evento único no mundo”, conta outro.
Foto de divulgação. Não disponível.
Em meio a carnes exóticas como a do ôrix (foto), um herbívoro das savanas africanas, a aproximação não se interrompe

 
Em Maputo, os empresários ficaram por quase uma hora à espera da chegada de Lula para seu discurso de encerramento do evento. Numa cena que impressionou os jornalistas locais, o grupo de mais de cem pessoas riu ruidosamente durante quase 30 minutos. Após iniciativa da parte brasileira, começou uma sessão de piadas, à qual logo aderiram os usualmente formais homens de negócios moçambicanos.
Os empresários brasileiros fazem sugestões para melhorar as próximas missões. Torná-las setoriais e encontrar mecanismos para incentivar a participação de médios empresários, e não apenas dos grandes, são algumas delas. Mas, a fala de Rodrigues, da Bauducco, sintetiza a impressão geral: “É uma outra maneira de desenvolver mercado. Não puramente comercial, mas também política. Aqui, no fundo, todos nós somos um pouquinho embaixadores”.