A conclusão do julgamento da admissibilidade ou não dos chamados embargos infringentes – recurso a que teriam direito 11 condenados na ação penal do mensalão – ficou para a sessão desta quinta-feira do plenário do Supremo Tribunal Federal, com um placar de 4 votos a 2 a favor da pretensão dos réus. A sessão desta quarta-feira (11/9) foi encerrada às 18h30.
Os ministros Teori Zavascki, Rosa Weber e Dias Toffoli aderiram ao voto divergente proferido no início da sessão desta quarta-feira(11/9) pelo ministro Roberto Barroso. O ministro Luiz Fux, quinto a se manifestar, acompanhou o voto em sentido contrário do ministro-relator Joaquim Barbosa proferido na sessão de quinta-feira passada.
Faltam ainda votar cinco ministros: Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski,Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello. A expectativa é de que o placar seja de, pelo menos, 6 votos a 5 pela admissibilidade dos embargos infringentes. A maioria seria consolidada por Lewandowski e Celso de Mello, pelo menos.
Nesta etapa final do julgamento dos recursos da ação penal do mensalão a maioria vai decidir, apenas, se os embargos infringentes são cabíveis em ação penal originária do STF. Se assim decidir, haverá possibilidade de revisão de pena para condenados que obtiveram na ação já julgada pelo plenário da Corte ao menos quatro votos favoráveis dos 11 possíveis.
A divergência
No seu voto – o primeiro lido na sessão desta quarta-feira (11/9) – o ministro Luís Roberto Barroso partiu do pressuposto de que os embargos infringentes estão previstos no artigo 333 do Regimento Interno do Supremo e, embora não constem do texto da Lei 8.038/1990, que passou a regular o processamento de ações no STF, não foram por ela extintos.Assim, a validade de tais embargos – que existem no processo penal brasileiro desde 1940 – “nunca foi expressamente revogada”.
Para Barroso, a “suposta lei revogadora do regimento”, diz, no artigo 12, que finda a instrução, o julgamento será disciplinado pelo Regimento Interno do tribunal superior. Assentou ainda que os embargos de declaração são aceitos pelo STF em matéria de ações de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade, conforme pronunciamentos (precedentes) de ministros já aposentados da corte por ele citados - como Moreira Alves, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence – em julgamentos posteriores à Lei 8.038/90.
Os ministros Joaquim Barbosa e Marco Aurélio interromperam o voto de Barroso para ressaltar que os precedentes citados por Barroso não se referem diretamente aos embargos infringentes em ações penais originárias. Ele concordou que não há precedentes diretos, mas reafirmou sua posição, tendo em vista “o Estado de direito e os princípios da segurança jurídica e dá legalidade”.
O ministro Celso de Mello – decano do STF e o último a votar – deu a nítida impressão de que vai seguir a divergência aberta pelo ministro Luís Roberto Barroso.O mais novo ministro do STF concluiu: “Não há por que submeter um processo tão emblemático a decisão casuística de última hora. Temos de virar esta página. Tenho a impressão de que à exceção dos 11 acusados que teriam direito a tal recurso, ninguém mais aguenta esse julgamento. A Constituição Federal existe para que o interesse de 11 (os réus que teriam direito ainda a tal recurso) não seja atropelado pelo interesse de milhões”.
O ministro Joaquim Barbosa não se convenceu, evidentemente, com os argumentos de Barroso, e reafirmou a sua posição, criando uma rápida discussão na qual também opinaram Marco Aurélio, Luiz Fux e Ricardo Lewandowski.
Voto de Barbosa
Na sessão da última quinta-feira (5/9), o relator da ação penal do mensalão, Joaquim Barbosa afirmara que o argumento utilizado pelos réus para a admissão dos embargos infringentes não se aplica nos casos de ação penal originária. Segundo ele, os embargos infringentes têm como finalidade a revisão de decisões proferidas por órgãos fracionários dos tribunais, como turmas ou seções, possibilitando nova decisão por órgão jurisdicional diverso e de composição mais ampla.“Nos termos do CPP que os embargos infringentes são cabíveis apenas nos casos de julgamento de apelação ou recurso, em sentido estrito,que são julgados nos órgãos fracionários, não se admitindo a interposição dessa modalidade recursal em ação penal originária do Supremo”, sustentou.
Na última quinta-feira,, o STF iniciou a análise dos agravos regimentais interpostos pelas defesas de Delúbio Soares e Cristiano Paz, réus na Ação Penal 470, contestando decisão do relator, que negara seguimento (julgou incabível) ao recurso de embargos infringentes contra a condenação. O relator negou provimento aos agravos por considerar que os embargos infringentes não se aplicam em casos de ação penal originada no Tribunal.Como teve quatro votos a seu favor no julgamento de mérito da ação na análise do crime de quadrilha, Delúbio, com base no artigo 333 do Regimento Interno do STF, pedia que a questão fosse novamente examinada pelo Tribunal. O ministro Joaquim Barbosa, em decisão individual, inadmitiu o recurso, mas o réu ingressou com agravo pedindo que a questão fosse levada a Plenário. Já o réu Cristiano Paz recorreu da decisão do relator que indeferiu pedido de sua defesa para ter prazo em dobro para apresentar embargos infringentes.O julgamento tinha sido interrompido, na quinta-feira, para que os advogados de defesa pudessem se manifestar sobre a validade dos recursos.
Se for aceita pela maioria que os embargos infringentes podem permitir novo julgamento quando há pelo menos quatro votos pela absolvição. A situação atende a pelo menos 11 réus: João Paulo Cunha, João Cláudio Genu e Breno Fischberg (no crime de lavagem de dinheiro); José Dirceu,José Genoino, Delúbio Soares, Marcos Valério, Kátia Rabello, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e José Salgado (no de formação de quadrilha).
Teori e Rosa Weber
O ministro Teori Zavascki, ao acompanhar a divergência aberta pelo seu colega Roberto Barroso, afirmou que os embargos infringentes em ação penal originária do STF constituem “recurso adequado a esta particularíssima ação penal”. E que não seria certo dizer que a Lei 8.038/90 “regulou inteiramente a matéria”; mas sim que “quanto à ação penal, o que há na lei é pura omissão”.
Para Zavascki, é preciso levar em conta a “interpretação teleológica da legislação”, ou seja, a que leva em conta a intenção da lei. “Salvo quanto ficar evidente o intuito do legislador de manter uma lacuna legislativa, deve-se suprir as lacunas mediante a aplicação das normas gerais”.Além disso, o segundo ministro mais novo da corte (que não participou do julgamento propriamente dito da ação penal do mensalão) sublinhou que o reconhecimento da “recorribilidade” das ações penais originárias nos tribunais superiores – e não apenas nos tribunais de segunda instância – está de acordo com a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de São José de Costa Rica), que consagra o direito de recurso em tidas as instâncias do Judiciário.
Em seguida, a ministra Rosa Weber leu o seu voto, fazendo questão de frisar – mais de uma vez – que “a questão é eminentemente técnica”. Como Zavascki – cujo voto citou – ela afirmou não haver incompatibilidade entre a norma do Regimento Interno do STF (que prevê os embargos infringentes) e a Lei 8.038/90 (que não tratou especificamente desse tipo de recurso). Ela não acolheu o entendimento de que os embargos deveriam ser acolhidos em face do Pacto de São José(duplo grau de jurisdição em qualquer instância). Mas acentuou que o direito processual penal é estritamente ligado ao “devido processo legal” e, portanto, à ampla defesa.
Assim, “na quadra atual”, segundo a ministra, não há como revogar as cláusulas regimentais incorporadas ao ordenamento jurídico, que foram“recepcionadas” pela Constituição de 1988.
Luiz Fux
O ministro Luiz Fux foi o único, na sessão desta quarta-feira, a acompanhar o ministro Joaquim Barbosa. Para ele, o Regimento Interno do STF foi recepcionado pela Constituição de 1988, “no máximo, como lei ordinária”. Assim, ficou suplantado por leis posteriores, no caso,pela Lei 8.038/90, que não previu os embargos infringentes para recorrer de condenações em ações penais originárias no STF.
Além disso, citou ampla literatura de processualistas e jurisprudência do próprio STF em casos de revisão criminal para defender o voto do ministro-relator Joaquim Barbosa, no sentido de que é “inadmissível” o recurso (embargos infringentes) em se tratando de ações penais julgadas em instância única e definitiva pelo Supremo. Ele reagiu às insinuações de que o STF estaria sendo “casuístico” se rejeitasse a admissibilidade dos embargos infringentes em ações penais originárias do STF, e insistiu no fundamento de que o Código de Processo Penal só admite tal tipo de recurso em acórdãos de tribunais de segunda instância. Mas jamais do Superior Tribunal de Justiça (competente para julgar governadores em ações penais, como instância única) e no STF(competente para julgar em ações penais congressistas e ministros de Estado, em instância única). Seria ”revisão criminal dissimulada”.
Toffoli
Em seguida, o ministro Dias Toffoli consolidou a maioria de quatro votos, na linha de que o artigo 333 do Regimento Interno do STF está em pleno vigor: “A Lei 8.038 confirmou o RI do STF como meio normativo processual para a realização do julgamento (de ações penais pelo STF)e seu prosseguimento”, afirmou.
Por Luiz Orlando Carneiro
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