Com a negativa, a auxiliar comercial Cristiane Amorim mudou o roteiro para o México e Roma |
Graças ao ingresso da classe C no mercado, o Brasil passa da 29ª posição no gasto de viajantes para a 12ª
Mirelle Pinheiro
Publicação: 16/12/2013
Nem mesmo um calendário recheado de eventos nos próximos anos — Copa do Mundo e Olimpíadas — é capaz de limitar a vontade dos brasileiros de partir para o exterior. Os Estados Unidos são um dos destinos preferidos: Miami ultrapassou Buenos Aires como cidade mais buscada.
Foram concedidos neste ano 1,070 milhão de vistos para o país, 50 mil a mais do que no ano passado. Segundo a Embaixada dos Estados Unidos, o índice de rejeição de pedidos continua em 5%. Muitas das pessoas que saem de mãos vazias, porém, se queixam da burocracia, da falta de esclarecimentos sobre o porquê da recusa e do prejuízo com a taxa, de R$ 380, que não é reembolsada.
Às vezes até mesmo pessoas com alta renda acabam barradas, sem maiores explicações. O dono de uma concessionária em Brasília, de 48 anos, que pediu para não ser identificado, teve o pedido recusado sete vezes. Na oitava, conseguiu. Em nenhuma das vezes os critérios de rejeição foram explicados ficaram claros.
As promoções de hospedagem e passagens acessíveis encheram os olhos da auxiliar de operações comerciais Cristiane Amorim, 33. Mesmo com sete anos de carteira assinada e casa própria, ela não conseguiu embarcar na viagem dos sonhos. Cristiane, que é solteira, foi à Embaixada dos Estados Unidos duas vezes levando a Carteira de Trabalho, contracheque e comprovante de residência.
Rumo a Roma
Apesar das tentativas, a resposta foi a mesma: não há como comprovar vínculo com o Brasil. Diante do impasse, a brasiliense teve que mudar de rota. Foi para o México e depois conheceu a capital italiana, Roma. Contudo, a vontade de embarcar para os Estados Unidos continua presente. “Pretendo fazer uma terceira tentativa, mas me sinto constrangida. É uma frustração muito grande. Pessoas com a situação financeira igual à minha foram aprovadas”, diz.“Muitas vezes, eles (os funcionários do consulado) mal olham para o nosso rosto. Por não apresentar uma boa aparência, julgam que o turista não tem condições de realizar uma viagem para o exterior” completa.
A nutricionista maranhense Samiriam Medeiros, 23, tinha como objetivo aproveitar as férias em Orlando e Miami. Ela viajou até Brasília para realizar a entrevista, pois o visto só pode ser obtido na capital federal e em outros três postos consulares no Brasil (Rio de Janeiro, São Paulo e Recife). Após o processo, Samiriam foi informada que não poderia ir ao Estados Unidos porque não conseguiu comprovar vínculo que a fizesse voltar ao Brasil.
“Acho os critérios para liberação do visto abusivos demais. O processo é dificil e caro. Eles supõem que qualquer pessoa tem um alto potencial para virar um imigrante ilegal. Negam sem mesmo encontrar o menor motivo para concluir que, de fato, há intenção de ficar nos EUA”, queixa-se Samiriam.
A grande dificuldade enfrentada para provar que o visitante tem condições de se manter no exterior a curto prazo pode esbarrar em questões jurídicas. “Existem restrições não declaradas para negar o visto ao viajante. O entrevistado não pode se sentir obrigado a apresentar o contracheque ou até mesmo o extrato bancário como documento de apoio”, afirma o professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Piscitelli.
A cônsul dos Estados Unidos em Brasília, Yolanda Parra, explica que a embaixada americana não exige comprovantes bancários. “O brasileiro precisa provar ao consulado que vai voltar para o país de origem. É preciso levar, na hora da entrevista, apenas o passaporte, uma foto recente e a página de confirmação da solicitação de visto para não-imigrante (fomulário DS-160), que está disponível na internet”.
Embora extratos bancários e a declaração do Imposto de Renda não sejam pedidos, podem ser apresentados como informação complementar para mostrar a capacidade econômica. Na prática, os candidatos ao visto acabam recorrendo a isso.
Maior interesse
Piscitelli conta que o ingresso da classe C no mercado de consumo, aliado a oferta de crédito contribuiu para o crescimento do interesse nos EUA. “Nem todo brasileiro sonha em morar nos Estados Unidos. O mercado de trabalho americano estreitou. Na época da crise muitos imigrantes voltaram e se estabeleceram no Brasil. Os viajantes sabem que, se você torna a sua estadia ilegal, consequentemente os direitos são restringidos, não pode contar com serviços básicos, como atendimento médico” completa.
A diferença de preços praticados no varejo do Brasil e dos Estados Unidos fez com que parte dos brasileiros mudassem o perfil das viagens.
Segundo Roberto Veiga, especialista em legislação bancária, existem dois mercados, o de pessoas que viajam para fazer compras e outras que procuram basicamente passeios turísticos. “Há um grupo de pessoas que seguem para os Estados Unidos com o compromisso comercial, compram bastante para revender no Brasil” afirma Veiga.
O grande fluxo de turistas brasileiros fez com que o Brasil saltasse da 29ª posição, em 2005, para a 12ª em 2012, no ranking mundial do consumo de turistas, realizado pela Organização Mundial do Turismo (OMT). Os gastos desses visitantes com passagens aéreas, aquisição de bens e serviços relacionados com o turismo, somaram US$ 1,9 bilhão em 2004. Em 2011 , tinham chegado a US$ 8,5 bilhões.
Em pesquisa de Viajantes Aéreos Internacionais (SIAT), do Departamento de Comércio dos EUA, as categorias mais importantes de gastos nos cartões de turistas brasileiros nos Estados Unidos estão relacionados a compras no varejo, tais como produtos eletrônicos e lojas de departamento.
De acordo com dados levantados em 2012, pela Associação de Viagens dos EUA (U.S. Travel Association), a despesa total dos turistas brasileiros em 2010 foi de US$ 5,9 bilhões. As altas cifras resultaram em aproximadamente 42 mil novas oportunidades de emprego nos EUA.
Facilidade suspensa
As denúncias sobre a suposta espionagem norte-americana estremeceram a relação entre Brasil e Estados Unidos. O estopim do conflito foi o cancelamento da viagem que Dilma Rousseff faria a Washington DC no dia 23 de outubro.
A presidente informou, por meio de nota, que classifica a interceptação das comunicações como "fato grave", e atentatório à soberania nacional, o que se torna incompatível com a convivência democrática entre países amigos. Contudo, o texto ressaltou que a decisão foi tomada em comum acordo com o governo americano.
Um dos temas que seriam discutidos entre os presidentes Barack Obama e Dilma na reunião prevista para outubro era um possível acordo facilitar a entrada de brasileiros em território norte-americano, por meio do Programa Global Entry.
Se a viagem não fosse interrompida, esta seria a primeira visita de estado de um governante brasileiros aos EUA, após 20 anos. O último presidente a pisar em terras americanas para uma visita diplomática foi Fernando Henrique Cardoso, em 1995.
De acordo com professor Roberto Piscitelli, a recusa de Dilma atrasou o processo de isenção. “A atitude da presidente pode sim ter abalado as negociações para a liberação do visto. Acredito que a discussão foi para gaveta e só será retomada após uma reconciliação oficial entre as duas partes” disse.
Yolanda Parra, cônsul da Embaixada dos EUA, afirma que para o Brasil ficar isento do visto é preciso cumprir uma série de exigências estabelecidas pelo governo americano. “Sabemos da importância do turista brasileiro para a economia do nosso país, mas não há nada definido. Existem critérios que o governo americano estabelece para os países com acordo diplomático ficarem isentos da necessidade de visto. O assunto ainda deve ser debatido, mas não há previsão” afirma.
» Fique ligado
A entrevista para o visto dos EUA dura aproximadamente cinco minutos. Perguntam a idade, a renda, a profissão, o que os pais fazem, para onde o turista pretende ir e quem está pagando a viagem
O que fazer
» Chegue no horário agendado,
pois as entrevistas não são
antecipadas ou atrasadas
» Leve o passaporte, página
de confirmação do
formulário eletrônico e
o recibo original de
pagamento da taxa de
solicitação de visto
» É importante levar documentos
que comprovem que o viajante tem
vínculo com o Brasil, como:
declaração da faculdade,
Carteira de Trabalho e
Certidão de Casamento
» Não compre as passagens
aéreas antes de obter o visto
» Responda apenas o
que for questionado
Foram concedidos neste ano 1,070 milhão de vistos para o país, 50 mil a mais do que no ano passado. Segundo a Embaixada dos Estados Unidos, o índice de rejeição de pedidos continua em 5%. Muitas das pessoas que saem de mãos vazias, porém, se queixam da burocracia, da falta de esclarecimentos sobre o porquê da recusa e do prejuízo com a taxa, de R$ 380, que não é reembolsada.
Às vezes até mesmo pessoas com alta renda acabam barradas, sem maiores explicações. O dono de uma concessionária em Brasília, de 48 anos, que pediu para não ser identificado, teve o pedido recusado sete vezes. Na oitava, conseguiu. Em nenhuma das vezes os critérios de rejeição foram explicados ficaram claros.
As promoções de hospedagem e passagens acessíveis encheram os olhos da auxiliar de operações comerciais Cristiane Amorim, 33. Mesmo com sete anos de carteira assinada e casa própria, ela não conseguiu embarcar na viagem dos sonhos. Cristiane, que é solteira, foi à Embaixada dos Estados Unidos duas vezes levando a Carteira de Trabalho, contracheque e comprovante de residência.
Rumo a Roma
Apesar das tentativas, a resposta foi a mesma: não há como comprovar vínculo com o Brasil. Diante do impasse, a brasiliense teve que mudar de rota. Foi para o México e depois conheceu a capital italiana, Roma. Contudo, a vontade de embarcar para os Estados Unidos continua presente. “Pretendo fazer uma terceira tentativa, mas me sinto constrangida. É uma frustração muito grande. Pessoas com a situação financeira igual à minha foram aprovadas”, diz.“Muitas vezes, eles (os funcionários do consulado) mal olham para o nosso rosto. Por não apresentar uma boa aparência, julgam que o turista não tem condições de realizar uma viagem para o exterior” completa.
A nutricionista maranhense Samiriam Medeiros, 23, tinha como objetivo aproveitar as férias em Orlando e Miami. Ela viajou até Brasília para realizar a entrevista, pois o visto só pode ser obtido na capital federal e em outros três postos consulares no Brasil (Rio de Janeiro, São Paulo e Recife). Após o processo, Samiriam foi informada que não poderia ir ao Estados Unidos porque não conseguiu comprovar vínculo que a fizesse voltar ao Brasil.
“Acho os critérios para liberação do visto abusivos demais. O processo é dificil e caro. Eles supõem que qualquer pessoa tem um alto potencial para virar um imigrante ilegal. Negam sem mesmo encontrar o menor motivo para concluir que, de fato, há intenção de ficar nos EUA”, queixa-se Samiriam.
A grande dificuldade enfrentada para provar que o visitante tem condições de se manter no exterior a curto prazo pode esbarrar em questões jurídicas. “Existem restrições não declaradas para negar o visto ao viajante. O entrevistado não pode se sentir obrigado a apresentar o contracheque ou até mesmo o extrato bancário como documento de apoio”, afirma o professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) Roberto Piscitelli.
A cônsul dos Estados Unidos em Brasília, Yolanda Parra, explica que a embaixada americana não exige comprovantes bancários. “O brasileiro precisa provar ao consulado que vai voltar para o país de origem. É preciso levar, na hora da entrevista, apenas o passaporte, uma foto recente e a página de confirmação da solicitação de visto para não-imigrante (fomulário DS-160), que está disponível na internet”.
Embora extratos bancários e a declaração do Imposto de Renda não sejam pedidos, podem ser apresentados como informação complementar para mostrar a capacidade econômica. Na prática, os candidatos ao visto acabam recorrendo a isso.
Maior interesse
Piscitelli conta que o ingresso da classe C no mercado de consumo, aliado a oferta de crédito contribuiu para o crescimento do interesse nos EUA. “Nem todo brasileiro sonha em morar nos Estados Unidos. O mercado de trabalho americano estreitou. Na época da crise muitos imigrantes voltaram e se estabeleceram no Brasil. Os viajantes sabem que, se você torna a sua estadia ilegal, consequentemente os direitos são restringidos, não pode contar com serviços básicos, como atendimento médico” completa.
A diferença de preços praticados no varejo do Brasil e dos Estados Unidos fez com que parte dos brasileiros mudassem o perfil das viagens.
Segundo Roberto Veiga, especialista em legislação bancária, existem dois mercados, o de pessoas que viajam para fazer compras e outras que procuram basicamente passeios turísticos. “Há um grupo de pessoas que seguem para os Estados Unidos com o compromisso comercial, compram bastante para revender no Brasil” afirma Veiga.
O grande fluxo de turistas brasileiros fez com que o Brasil saltasse da 29ª posição, em 2005, para a 12ª em 2012, no ranking mundial do consumo de turistas, realizado pela Organização Mundial do Turismo (OMT). Os gastos desses visitantes com passagens aéreas, aquisição de bens e serviços relacionados com o turismo, somaram US$ 1,9 bilhão em 2004. Em 2011 , tinham chegado a US$ 8,5 bilhões.
Em pesquisa de Viajantes Aéreos Internacionais (SIAT), do Departamento de Comércio dos EUA, as categorias mais importantes de gastos nos cartões de turistas brasileiros nos Estados Unidos estão relacionados a compras no varejo, tais como produtos eletrônicos e lojas de departamento.
De acordo com dados levantados em 2012, pela Associação de Viagens dos EUA (U.S. Travel Association), a despesa total dos turistas brasileiros em 2010 foi de US$ 5,9 bilhões. As altas cifras resultaram em aproximadamente 42 mil novas oportunidades de emprego nos EUA.
Facilidade suspensa
As denúncias sobre a suposta espionagem norte-americana estremeceram a relação entre Brasil e Estados Unidos. O estopim do conflito foi o cancelamento da viagem que Dilma Rousseff faria a Washington DC no dia 23 de outubro.
A presidente informou, por meio de nota, que classifica a interceptação das comunicações como "fato grave", e atentatório à soberania nacional, o que se torna incompatível com a convivência democrática entre países amigos. Contudo, o texto ressaltou que a decisão foi tomada em comum acordo com o governo americano.
Um dos temas que seriam discutidos entre os presidentes Barack Obama e Dilma na reunião prevista para outubro era um possível acordo facilitar a entrada de brasileiros em território norte-americano, por meio do Programa Global Entry.
Se a viagem não fosse interrompida, esta seria a primeira visita de estado de um governante brasileiros aos EUA, após 20 anos. O último presidente a pisar em terras americanas para uma visita diplomática foi Fernando Henrique Cardoso, em 1995.
De acordo com professor Roberto Piscitelli, a recusa de Dilma atrasou o processo de isenção. “A atitude da presidente pode sim ter abalado as negociações para a liberação do visto. Acredito que a discussão foi para gaveta e só será retomada após uma reconciliação oficial entre as duas partes” disse.
Yolanda Parra, cônsul da Embaixada dos EUA, afirma que para o Brasil ficar isento do visto é preciso cumprir uma série de exigências estabelecidas pelo governo americano. “Sabemos da importância do turista brasileiro para a economia do nosso país, mas não há nada definido. Existem critérios que o governo americano estabelece para os países com acordo diplomático ficarem isentos da necessidade de visto. O assunto ainda deve ser debatido, mas não há previsão” afirma.
» Fique ligado
A entrevista para o visto dos EUA dura aproximadamente cinco minutos. Perguntam a idade, a renda, a profissão, o que os pais fazem, para onde o turista pretende ir e quem está pagando a viagem
O que fazer
» Chegue no horário agendado,
pois as entrevistas não são
antecipadas ou atrasadas
» Leve o passaporte, página
de confirmação do
formulário eletrônico e
o recibo original de
pagamento da taxa de
solicitação de visto
» É importante levar documentos
que comprovem que o viajante tem
vínculo com o Brasil, como:
declaração da faculdade,
Carteira de Trabalho e
Certidão de Casamento
» Não compre as passagens
aéreas antes de obter o visto
» Responda apenas o
que for questionado
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