Não é por falta de escândalos que os órgãos responsáveis por investigações e punição no Brasil deixam de atuar. Irregularidades, denúncias, saque aos cofres públicos, negociatas entre governo e empreiteiras... Os exemplos são muitos e não param surgir, alimentados pela impunidade que reina no país.
Enquanto falcatruas depredam o patrimônio público, PF caça black blocs
Enquanto as falcatruas se sucedem, as autoridades parecem mais preocupadas em atacar outras frentes, reprimir outro tipo de ação, ação que se revolta exatamente contra os maus governantes que priorizam seus interesses.
Enquanto o desmando impera nas grandes esferas do poder e vandaliza o patrimônio público em proporções incalculáveis, a Polícia Federal concentra suas forças na investigação contra os black blocs, seus paus e pedras.
No Congresso, os supersalários, mesmo ilegais, parecem intocáveis. Parlamentares chegam a receber mais R$ 60 mil brutos, somando remunerações e aposentadorias, enquanto o teto constitucional é de R$ 28 mil. O que diz a Constituição e as leis pouco importa para os que embolsam além do permitido.
Em São Paulo, o escândalo dos fiscais que teriam fraudado Impostos sobre Serviços e até o IPTU pode chegar a casa dos R$ 500 milhões. Escutas, ameaças e muito dinheiro circulam na esfera do município, enquanto o ex e o atual prefeitos trocam acusações.
"Havia degradação na prefeitura de São Paulo", afirma Fernando Haddad.
"Descalabro é primeiro ano do atual governo", rebate Gilberto Kassab.
No Rio de Janeiro, superfaturamento e denúncias envolvendo empreiteiras e o governo tomaram conta dos noticiários. A Delta e sua coleção de escândalos causou indignação à sociedade, detonando protestos até em frente à casa do governador Sérgio Cabral.
A Delta monopolizou as grandes obras com dinheiro público no Rio, passando pelo PAC e pelo Maracanã. A empreiteira de Fernando Cavendish protagonizou uma das maiores ascensões empresariais já vistas no país, até sua relação com o contraventor Carlinhos Cachoeira vir à tona.
O deputado federal Paulo Maluf é mais um personagem do mundo político que, apesar das denúncias e acusações, parece ressurgir das cinzas e se mantém no cenário, talvez até participando das próximas eleições. O capítulo mais recente foi sua condenação por superfaturamento em obra do complexo viário Ayrton Senna, de 1990.
Soma-se a estes casos o de Ângelo Calmon de Sá - ex-dono do Banco Econômico - que, com mais de 30 processos criminais, muitos ainda sem decisão de sentença, continua em liberdade, mesmo após ter sido condenado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) a 13 anos de reclusão por gestão fraudulenta de instituição financeira.
E há ainda o caso do Banco Cruzeiro do Sul. O escândalo mais recente dá conta de que credores pedem R$ 113 milhões ao Morgan Stanley, com notificação judicial, referente à venda de ações pelos ex-controladores Luís Octavio e Luiz Felippe Índio da Costa, justamente duas semanas antes da intervenção do Banco Central. Os dois são acusados de provocar a falência do banco e causar prejuízo de R$ 3,8 bilhões ao Sistema Financeiro. Ficaram conhecidos também pela contribuição a campanhas de políticos. O principal beneficiado teria sido José Serra, que se candidatou à presidência tendo o sobrinho e primo dos ex-controladores - o ex-deputado Índio da Costa - como vice.
Enquanto isso, o BNDES abre generosamente seus cofres públicos para empréstimos de grande vulto. Somente para o empresário Eike Batista - que amarga prejuízo histórico e de proporções internacionais - as cifras chegam a R$ 1 bilhão, fora os para empreiteiras que, além de ganhar licitações para grande obras, ainda contam com a ajuda do dinheiro do governo.
Perto destes e tantos outros exemplos de depredação do patrimônio público e vandalismo contra os princípios da ética e da dignidade da sociedade, os black blocs mais parecem meninos indefesos e inofensivos.
Marcus Ianoni, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fuminense (UFF), ressalta que a sociedade brasileira ainda precisa percorrer um longo caminho para que a igualdade de todos perante a lei se efetive plenamente. A desigualdade no tratamento a cidadãos é feita pelo Estado, reforça, com respaldo de setores da própria sociedade.
"As ilegalidades dos 'vândalos' atentam contra o Estado de Direito assim como as ilegalidades de empresários e políticos. Não deveria haver dois pesos e duas medidas. Ilegalidade é ilegalidade. O Estado e a opinião pública não devem fazer vista grossa ou dar desconto às ilegalidades de uns e ser rigoroso em relação à ilegalidade de outros. Fazer isso é oferecer tratamento privilegiado a alguns grupos, o que é um comportamento que reproduz hierarquias sociais de corte oligárquico. Precisamos acabar com os privilégios oligárquicos. A República Democrática deve aplicar a lei igualmente para todos. Um dos principais conteúdos da democracia é a igualdade", explica.
Por JB
Por JB
Nenhum comentário:
Postar um comentário