Você acha que a forma como as pessoas gastam ou guardam o dinheiro tem relação com a autoestima?
Total. Eu diria que não é nem em relação à forma com que as pessoas guardam o dinheiro, mas, sim, à forma com que gastam o dinheiro. O brasileiro é, em geral, independente da classe social, e por não ter educação financeira (isso vale para homens e mulheres), tende a assumir gastos ou exagerar naqueles gastos chamados de burocráticos, tais como: plano de saúde, carro, casa, escola. Nós adotamos primeiro o padrão de vida que é basicamente estrutural e, se der, ou quando der, pensaremos em poupança ou lazer e bem-estar. O que acontece daí, durante uma boa parte do ano, é que a gente vive naquela rotina de acordar, trabalhar e pagar contas, enfim, de uma vida burocrática, e quando sobra um dinheiro, vai para o lazer, pois ele não faz parte da rotina das pessoas.
Quando entra um 13º salário, eventualmente o lazer acontece, mas quando o brasileiro se propõe a fazer uma atividade de bem-estar, antes vem certo sentimento represado, um desejo de realizar vontades que vêm se acumulando, então surge a compulsão: comprar mais do que deveria, comprar roupas, comprar o que eu não comprei nos últimos meses, e já que comprar é uma cosia tão rara, vou adiantar e comprar um pouquinho mais.
E então o consumo acaba acontecendo em picos: compro em um determinado mês, parcelo em oito vezes e me obrigo a não comprar mais durante esses meses. Isso é ruim tanto para a pessoa como para o comércio, que também acaba funcionando em picos.
Nestes casos, o que seria mais saudável fazer?
Seria fazer uma espécie de autoanálise, autoconhecimento, conversar mais sobre vontades e sonhos, é isso que eu abordo no livro Casais inteligentes enriquecem juntos. Se a pessoa tiver uma noção mais clara do que faz bem, ela pode garantir uma verba regular para aquilo que faz bem. Por exemplo, se estar na moda me faz bem, eu vou gastar uns 200 ou 300 reais por mês para estar na moda, mas se necessariamente eu gasto mais com esse item, tenho que diminuir os demais itens, comprar um carro um pouco mais barato, uma casa mais simples. Entendendo que uma vida mais simples é a lição para uma vida mais rica.
Essa pessoa que gastar mais com aquilo que lhe fizer bem certamente é uma pessoa que estará psicologicamente melhor. Estará com a autoestima equilibrada, trabalhará melhor, terá a probabilidade de aumentar sua renda na vida, pois vai viver de forma mais prazerosa.
E como lidar com o parceiro que ganha menos? Pois hoje sabemos que muitos lares brasileiros são chefiados por mulheres.
Na verdade, a questão pode até soar como desafiadora, porque é normal as mulheres viverem com parceiros que ganham mais. A abordagem que eu tenho no meu trabalho é de que pouco importa quem ganha mais, o mais importante não é só o casal ter um papo aberto sobre dinheiro, mas, principalmente, batalhar para que a renda da família seja a melhor e a maior possível.
Qual seria a prioridade de um casal para crescerem juntos?
A prioridade é continuamente discutir uma estratégia de carreira não dos indivíduos, mas da família, como ter sempre um plano “B”. Exemplo: caso minha esposa seja convidada para trabalhar na Europa. Será bom para a família? Será bom para o homem assumir o papel de dono da casa por certo tempo? Assumir um trabalho temporário por certo tempo? Discutir essa estratégia é importante pois, quando surgir a oportunidade, normalmente ela vem carregada de sentimentos, a promoção, o momento da carreira, e é importante que o casal esteja preparado.
Quando se discute desta forma, em que ambos estão batalhando a renda da família, fica muito mais fácil lidar com situações que são muito comuns. Outro exemplo: ele perder o emprego e ela ter que assumir o papel de provedora, ou ela ter que se afastar do trabalho por quatro meses para amamentar um filho e ele assumir o papel de provedor. Nos casais antigos, ao negociar para dividir contas existe uma pressão incrível para que a mulher volte ao trabalho mesmo que queira amamentar, e uma pressão também para que o homem arrume um trabalho o quanto antes, mesmo que esteja difícil. Neste sentido, o relacionamento passa a ser mais uma competição do que uma união.
O planejamento do casal é um só, e ambos têm que trabalhar para que essa renda e esse bem-estar sejam comuns ao longo da vida.
Você acha que é possível se reeducar financeiramente num mundo voltado para o consumo?
É possível, mas é um desafio. Nós estamos falando de um casal que tem que achar um tempo na agenda para estar junto, não só simplesmente para curtir a vida, mas para conversar, tomar um vinho, mas esse vinho tem que ser um momento para conversar como está o relacionamento, se está legal, se estão alcançando os sonhos que queriam.
Começar do nada é difícil, agora, se o casal já discute planos da família e dos indivíduos, dele e dela, é muito mais fácil sentar e ver se os planos estão acontecendo ou não. Então é legal em algum momento o casal sentar e falar: “Vamos bater um papo sobre os nossos sonhos: o que está faltando na vida para você e para mim?” E quando se fala em sonhos, naturalmente caímos na ideia de obstáculos para estes sonhos acontecerem, e aí a gente encontra os elementos de força deste casal, e o tem que fazer para que mais sonhos se realizem. Não só os da família, como também dos indivíduos.
E quanto àquelas pessoas que são consumistas compulsivas, as chamadas “overspending”? O que é possível fazer nestes casos?
Os próprios psicólogos dizem que o consumo compulsivo é realmente patológico e demanda acompanhamento de terapia em 8% a 10% dos casos. Eu vejo que o restante dos 90% dos casos pelo menos é uma simples questão de desorganização pessoal, a pessoa gosta de se cuidar, gosta de jantar fora, praticar um esporte, e não garante verba para isso, então é óbvio que ela vai acumular compunção, ela vai de certa forma desenvolver um sentimento de desconforto e incômodo em relação à proibição de não poder ser “feliz”.
O que as pessoas devem entender é que na hora de escolher um estilo de vida, que se decide casar, ter filhos, antes de escolher a casa que irá ter, é muito mais importante definir o bairro em que irá morar, quanto custaria a qualidade de vida, academia que se quer fazer, a ida ao shopping, visitar a família, receber amigos, e isso pode ser muito para algumas pessoas. E, se custa muito, essas pessoas têm que ter estrutura funcional, um custo de manutenção na vida mais simples, mais barato.
Os preços dos imóveis de um modo geral subiram muito. E como fica a realização de muitos brasileiros em conquistar a casa própria?
Qualquer sonho, não importa se é carro, casa ou viagem, pode ser realizado com dois elementos: com dinheiro e ou com criatividade. Pois, quanto mais criatividade se tem, menos do dinheiro precisamos. Existe a lógica: os imóveis estão realmente muito caros, mas existem aqueles mais antigos, que, de repente, pagando bem menos com uma reforma, é possível criar um clima vintage, resgatar um estilo antigo de viver. Quanto mais eu buscar aquilo que está na moda – e o padrão é de três dormitórios, com clube embaixo, com quatro vagas na garagem – mais eu vou entrar no preço da moda, que é um preço absurdo. Então é questão de ter uma postura mais criativa, e isso vale para meio de transporte também, eu vejo as pessoas falando: como é que eu vou ter um carro de 30 mil, caramba? Tem carro de 3 mil que você pode reformar com mais 6 ou 7 mil reais e ter um carro fashion, com algo diferente. Depende muito da postura em relação à sua consciência de consumo.
E como podemos lidar com a chegada da aposentadoria? Como devemos nos preparar para esse momento? Caso a pessoa tenha o próprio negócio, ou mesmo quando for CLT?
Independentemente de a pessoa ter tido o próprio negócio ou não, ou ter sido empregada, ela tem que entender que se tem um negócio próprio e se esse negócio parar quando ela tirar férias, ela é empregada do mesmo jeito, empregada dela mesma. O dinheiro não entra se a pessoa não trabalhar, então temos que encontrar meios de nos tornarmos financeiramente independentes. Existem dois raciocínios em relação à aposentadoria: um é o raciocínio “arroz e feijão”, que é poupar aproximadamente 10% do que ganhamos ao longo de toda uma carreira de 35 anos, criar um patrimônio que garantirá a média que se teve durante a carreira. Então essa é a regra básica de aposentadoria. Existe outra visão, da qual eu gosto mais, que é você entender que não precisa se aposentar. Por exemplo: você trabalha numa carreira que é desgastante, que toma muito sua agenda, que exige certa pressão, demanda muito estresse, e por isso talvez você queira largá-la e, então, fará um pé de meia para mudar de carreira lá na frente: montar um estúdio de arquitetura, trabalhar com arte, ser consultor, dar aulas...
E a perspectiva de vida aumentou muito também, certo?
Mais do que o custo de vida ter aumentado, o tempo de vida aumentou. Antigamente, as pessoas pensavam em se aposentar com 60 e 65 anos, mas elas não contavam com pouco mais de cinco ou dez anos de vida. Hoje, quem se aposenta com essa idade corre o risco de viver outros 30 ou 35 anos. O que eu considero aposentadoria é o modelo de ideia... vamos chamar de aposentadoria “Oscar Niemeyer”, que trabalha desde a década de 50, mas que continua produzindo até hoje, nos seus 103 anos de idade. Isso acontece porque ele faz o que gosta, ele sente que agrega valor ao mundo, é premiado porque é apaixonado pelo que faz, e quanto mais a pessoa gosta da carreira dela, menos perto da aposentadoria ela estará.
Sites recomendados para conquistar a independência financeira: